O suicídio se torna cada vez mais alvo de preocupação de profissionais da saúde e educadores. É a segunda principal causa de morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos. Ao todo, 800 mil pessoas tiram suas vidas todos os anos, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde). A discussão – e a busca de soluções para o problema – de repente tomou livros, podcasts e campanhas de conscientização, como o Setembro Amarelo. Mas olhar para o passado também pode ser uma saída.
Já no século 20, Viktor Emil Frankl foi um dos nomes relevantes no combate às altas taxas de suicídio na Europa. Apesar de não ser comumente lembrado, como Sigmund Freud ou Carl Gustav Jung, Viktor se tornou um dos maiores nomes da psiquiatria mundial. Seu interesse junto à área da saúde mental começou muito cedo, e Viktor levou sua paixão para a vida toda, utilizando de sua própria biografia e obstáculos para criar sua corrente de pensamento, conhecida como Logoterapia.
Foi graças à Logoterapia que o ainda estudante de medicina Viktor Frankl foi capaz de zerar o registro de suicídios entre jovens em 1930 na Áustria, acompanhando-os através de centros de aconselhamento para jovens.
A Logoterapia é um sistema filosófico que une teoria e prática, e tem como principal objetivo a busca pelo sentido da vida. Esse sistema é reverenciado até hoje, com diversas escolas que surgiram a partir da ramificação do pensamento do psiquiatra.
Por meio dessa corrente filosófica, Viktor contribuiu para salvar a vida de milhares de pessoas, principalmente em um momento de tanta transição, como é o caso de adolescentes e jovens que estão na faixa etária mais atingida pelo suicídio.
Quem foi Viktor Frankl
Viktor Emil Frankl nasceu em Viena, na Áustria, em 26 de março de 1905. Desde pequeno se interessou pela área da psicologia e, por conta disso, começou a se corresponder através de cartas com Sigmund Freud. Isso mesmo, o próprio pai da psicanálise.
No ano de 1921, com apenas 16 anos, Viktor participou de sua primeira conferência, que tinha como tema “O Sentido da Vida“. Esses foram os primeiros passos para a preparação de sua corrente psico-filosófica que viria a se tornar a Logoterapia.
Anos mais tarde, aos 19 anos, o então estudante de medicina publica seu primeiro artigo científico na Internacional Journal of Individual Psychology.
Durante os anos de 1933 e 1936, já graduado em medicina, Viktor se tornou responsável pelo pavilhão de mulheres que haviam tentado suicídio no Hospital Psiquiátrico de Viena.
Além de seu evidente interesse pela psicoterapia, o psiquiatra também era um ativo membro de associações e organizações de cunho socialista lideradas por jovens – que influenciou em sua decisão de permanecer na Áustria durante a invasão alemã da Segunda Guerra Mundial mesmo sendo judeu.
Durante a guerra, Viktor passou por obstáculos inimagináveis e esteve por longos anos preso em campos de concentração (tendo sido libertado apenas no fim do conflito). Ao sair, descobriu que havia perdido a esposa grávida, seu irmão e os pais, que também estavam em outros campos de concentração.
Ao contrário do que se poderia imaginar, os horrores da guerra não afastaram o psiquiatra dos estudos e da construção da sua própria filosofia – apenas o tornaram mais obstinado. Sempre que possível tecia anotações sobre seus pensamentos, que mais tarde se consolidaram na Logoterapia.
A terapia do propósito
A Logoterapia é uma corrente psico-filosófica que tem como objetivo a busca pelo sentido da vida. Viktor acreditava que somente ao encontrar uma razão de viver o indivíduo seria um verdadeiro apreciador da vida humana.
A palavra vem da união de palavras gregas logos, que significa sentido, e therapeia, que significa tratar, prestar cuidados. Ela é conhecida como a Terceira Escola Vienense de Psicoterapia – sucessora da Psicanálise Freudiana e da Psicologia Individual de Alfred Adler.
Segundo a Logoterapia, todo humano é capaz de encontrar a própria felicidade. Como fazer isso? Por meio de algo que nos preencha com a razão de viver. Seja encontrando um amor, praticando atos de voluntariado, encontrando um trabalho gratificante ou mesmo por meio de experiências, as pessoas seriam capazes de avaliar os sofrimentos de outra maneira, verdadeiramente encontrando um propósito para a vida.
Algum tempo depois de sua saída do campo de concentração, Viktor lançou o livro Em Busca de Sentido, em que relata sua experiência durante a prisão, suas dolorosas perdas e, a partir de toda sua vivência, introduz o leitor às bases de sua teoria filosófica.
Na Logoterapia, cada pessoa é verdadeiramente independente, em todos os sentidos. Mesmo sob fatores condicionantes biológicos, psicológicos, sociais, entre outros, seriamos responsáveis por construir nossa história com as condições que temos e, a partir delas, tentar encontrar nosso verdadeiro legado e propósito de vida.
Sebastião Ferreira, psicólogo clínico e membro da diretoria da ABLAE (Associação Brasileira de Logoterapia e Análise Existencial) explica que “em meio a uma sociedade carente de valores e de perspectivas, onde as oportunidades e motivações não correspondem aos anseios profundos dos jovens, uma proposta logoterapêutica se apresenta como uma possibilidade de ressignificação e de sentido para a vida da juventude”.
A Logoterapia aplicada aos jovens
Preocupado com a alta taxa de suicídios entre jovens na Áustria, em 1927, quando ainda cursava medicina, Viktor criou diversos centros gratuitos de aconselhamento. Eles foram inaugurados primeiro na capital, Viena, e logo em seguida se expandiram para outras cidades do país.
A partir daí, tornaram-se um ponto de ajuda psicológica para os jovens, que em sua maioria ainda estavam no período escolar. O próprio Viktor relata em seus livros que pela primeira vez na história da psiquiatria, os centros de aconselhamento tinham um atendimento diferencial para este público – que geralmente se dava no momento de distribuição dos boletins escolares.
Por meio da avaliação do desempenho escolar, os profissionais conseguiam identificar os estudantes em vulnerabilidade. O olhar cuidadoso gerou resultados: os registros de suicídios entre jovens no país durante o período zeraram.