A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a mera ausência de confissão do autuado, durante o inquérito policial, não impede que o Ministério Público analise o oferecimento do acordo de não persecução penal.
O colegiado anulou decisão da Justiça do Rio de Janeiro que, mesmo diante do pedido da defesa, não remeteu os autos para serem apreciados pelo procurador-geral de Justiça, depois que o membro do Ministério Público em primeira instância deixou de oferecer o acordo, sob o argumento de que o acusado não havia confessado o delito na fase do inquérito.
O juiz, ao rejeitar o pedido, justificou que, além de não ter sido preenchido o requisito objetivo da confissão, o acordo não é um direito subjetivo do acusado, mas uma faculdade do órgão acusador. Impetrado habeas corpus no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a ordem foi denegada. Para a corte estadual, a remessa dos autos ao procurador-geral seria ineficaz, diante da impossibilidade do acordo devido à falta da confissão.
Em novo habeas corpus, a defesa requereu ao STJ que o processo fosse apreciado pelo procurador-geral para verificar a possibilidade do acordo.
Acordo não pode deixar de ser proposto sem justificativa idônea
O relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, ao determinar a remessa dos autos à instância revisora do Ministério Público, reafirmou o entendimento do STJ de que, nos mecanismos da Justiça penal consensual, embora não haja direito subjetivo do réu, há um poder-dever do titular da ação penal, que é diferente de uma simples faculdade do órgão, como foi apontado na instância de origem.
Schietti destacou que o acordo de não persecução penal, disposto no artigo 28-A do Código de Processo Penal (CPP), é um instituto despenalizador que busca a otimização do sistema de Justiça criminal, por isso não pode deixar de ser aplicado sem justificativa idônea. Ele apontou que, no caso de recusa por parte do membro do Ministério Público, o investigado poderá requerer a remessa dos autos ao órgão superior, conforme o artigo 28-A, parágrafo 14, do CPP.
No caso em julgamento, o relator observou que o acusado estava sem advogado no momento em que foi interrogado na polícia e preferiu ficar em silêncio, e não consta que tenha sido informado sobre a possibilidade de celebração do acordo caso admitisse o crime.
“Não há como simplesmente considerar ausente o requisito objetivo da confissão sem que, no mínimo, o investigado tenha ciência sobre a existência do novo instituto legal (acordo de não persecução penal) e possa, uma vez equilibrada a assimetria técnico-informacional, refletir sobre o custo-benefício da proposta “, afirmou o ministro.
Exigência de confissão no inquérito pode levar à autoincriminação antecipada
Schietti considerou também que a exigência de confissão ainda na fase policial poderia levar a uma autoincriminação antecipada, apenas com base na esperança de oferecimento do acordo, o qual – segundo o ministro – poderá não ser proposto em razão da falta de requisitos subjetivos ou de outro motivo, conforme a avaliação do Ministério Público.
“Além de, na enorme maioria dos casos, o investigado ser ouvido pela autoridade policial sem a presença de defesa técnica e sem que tenha conhecimento sobre a existência do benefício legal, não há como ele saber, já naquela oportunidade, se o representante do Ministério Público efetivamente oferecerá a proposta de acordo ao receber o inquérito relatado”, disse o magistrado.
Com a concessão do habeas corpus, a Sexta Turma ordenou a remessa do caso ao procurador-geral de Justiça do Rio de Janeiro e a suspensão da ação penal até a sua decisão, anulando todos os atos processuais posteriores à negativa do juiz.
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